Em comunidades ribeirinhas, indígenas e quilombolas da Amazônia, parteiras tradicionais exercem um papel fundamental na promoção da saúde e preservação cultural. Mais do que trazer vidas ao mundo, essas mulheres — e alguns homens — integram a rede de cuidados comunitários e mantêm vivos saberes ancestrais, transmitidos de geração em geração.
A atuação dessas parteiras é especialmente crucial em regiões de difícil acesso, onde muitas vezes são a única referência em saúde para gestantes. Reconhecidas tanto pelo Ministério da Saúde quanto pela Organização Mundial da Saúde (OMS), elas desempenham funções que vão além dos partos, incluindo o encaminhamento de gestantes a serviços especializados, o apoio afetivo e espiritual e ações de promoção à saúde.
Apesar de sua importância, o reconhecimento formal ainda é limitado. Muitas seguem atuando sem remuneração e com pouca integração ao Sistema Único de Saúde (SUS). “São mais de mil mulheres só no Amazonas fazendo um trabalho essencial de saúde pública, complexo e exaustivo, sem receber por isso”, destaca Maria Cecília Gomes, coordenadora do Programa de Qualidade de Vida do Instituto Mamirauá.
Com sede em Tefé (AM), o Instituto Mamirauá atua há mais de duas décadas no fortalecimento da atuação das parteiras tradicionais no Médio Solimões. Somente no Amazonas, mais de 1.100 parteiras já foram identificadas e cadastradas. Em parceria com a Associação de Parteiras Tradicionais do Estado do Amazonas – Algodão Roxo (APTAM) e com a Fiocruz Amazônia, o Instituto desenvolve ações voltadas à valorização desses saberes, como capacitações, apoio ao associativismo e pesquisas científicas.
Uma das iniciativas de destaque foi a distribuição de lanternas solares — doadas pela Fundação Schneider Electric —, facilitando o trabalho das parteiras em comunidades sem energia elétrica. A articulação com agentes comunitários de saúde e o apoio à representação política da APTAM também fazem parte da estratégia de valorização e fortalecimento dessa rede de cuidados.
Em 2019, uma pesquisa conduzida pelo Instituto Mamirauá, com a colaboração de parteiras, identificou 53 espécies de plantas medicinais utilizadas por essas profissionais. Entre elas está o algodão-roxo, planta símbolo da associação estadual, reconhecida por suas propriedades no combate a infecções e hemorragias pós-parto.
Em 2024, a prática das parteiras tradicionais foi oficialmente reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), reforçando a importância desses saberes para a identidade e saúde das populações amazônicas.
A comemoração pelo Dia das Parteiras será estendida neste ano. No dia 16 de maio, uma roda de conversa reunirá parteiras tradicionais, representantes da Prefeitura de Tefé, do Instituto Mamirauá e de outras instituições parceiras. O encontro será marcado por trocas de saberes, vacinação e práticas integrativas de saúde.
Celebrar o Dia das Parteiras é mais do que uma homenagem: é um ato de reconhecimento e valorização dos saberes que sustentam vidas e resistem há séculos na floresta amazônica.